Na tentativa de solucionar o problema do abuso sexual, muito se fala da possibilidade de induzir a castração química do ofensor sexual. O procedimento de castração química é um método reversível, que consiste no uso de remédios que agem sobre a testosterona, diminuindo a libido. Quem faz essa proposta, parte da ideia de que, com menos desejo sexual ou sem a possibilidade de manter uma ereção, o agressor perderia o interesse ou os meios para cometer a violência sexual.
Infelizmente, tenho notícias nada animadoras para quem acredita nessa solução.
Quando se trata desse tipo de violência, devemos lembrar que a relação sexual é apenas um dos atos, dentre inúmeras condutas abusivas possíveis. Nesse sentido, mesmo sem condições de alcançar uma ereção, um agressor pode empreender uma infinidade de práticas, inclusive de penetração digital ou com o uso de objetos.
Há ainda que se considerar que o comportamento abusivo não deriva necessariamente de um interesse erótico por crianças. Para a maioria dos agressores, o abuso se dá por razões como: raiva, vingança, alívio de estresse, percepção de alguma oportunidade ou por uma espécie de exercício de poder sobre a vítima. Nesses casos, a castração química não teria qualquer ação contra a reincidência, já que agir sobre a libido desses indivíduos não teria impacto em outros tipos de motivação.
Algumas das críticas feitas às propostas de castração química para ofensores sexuais levantam o problema da falta de um perfil comum a esses agressores. Médicos especialistas no assunto, como o Dr. Danilo Barbieri, Coordenador do Ambulatório de Transtornos de Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC, atestam a impossibilidade de encontrar um tratamento padrão que tenha ação efetiva para todos os agressores sexuais. Segundo ele, é preciso entender as particularidades de cada caso para traçar uma terapêutica individualizada. Conforme o profissional coloca, a maioria dos agressores pode se beneficiar de atendimento psicoterapêutico, muitos deles vão necessitar também de tratamento psiquiátrico, mas apenas uma minoria teria indicação médica para o procedimento de castração química, conhecido tecnicamente pelo nome de terapia antagonista da testosterona.
Embora tanto psicólogos quanto psiquiatras tragam contrapontos a esse tipo de solução, alertando para a pouca efetividade dessa prática, diversos países permitem ou propõem a castração química de agressores sexuais. Em alguns lugares, esse é um tratamento que o agressor pode solicitar voluntariamente, enquanto em outros é pré-condição para a liberdade ou para a progressão da pena. A terapia antagonista da testosterona para ofensores sexuais é usada no Canadá, na Argentina, na Suécia, na Polônia, na Rússia, na Itália, na França, na Indonésia, na Dinamarca e no Oriente Médio, além de em alguns estados dos EUA. Na Califórnia, a castração cirúrgica também é indicada em alguns casos.
No Brasil, vários projetos de lei já tentaram instituir a aplicação da castração química a autores de violência sexual. Sobre isso, é bom que se saiba que os medicamentos com poucos efeitos colaterais administrados mensalmente nesses casos são bastante caros. Aplicar tal terapêutica a todos os ofensores, traria um custo alto, com pouca eficácia prática. Nesse sentido, outros programas de prevenção podem trazer melhores resultados com um menor investimento.
Juliana Borges Naves