Falar sobre abuso sexual de crianças e adolescentes é sempre algo muito delicado e que envolve uma série de dúvidas, angústias e medos. Às vezes sentimos um incômodo, um certo mal-estar, ou ainda uma vontade grande de mudar de assunto. Isso fica ainda pior quando falamos de abuso sexual praticado por alguém da família ou envolvendo crianças muito pequenas.
Como esse assunto é desconfortável e, por vezes, assustador, uma reação comum das pessoas é tentar afastar a ideia e pensar que isso só acontece “com os outros”, “na família dos outros” ou ainda que é algo que “acontece pouco”, já que raramente ficamos sabendo de uma criança que foi molestada sexualmente em nosso meio. Ou seja, é como se esse assunto tão difícil ativasse uma defesa psicológica diante de algo que pode causar grande sofrimento.
Além disso, na nossa sociedade existem uma série de mitos e crenças erradas que trazem informações que não são verdadeiras, reforçando a reação psicológica de afastar as ideias que incomodam. Fazem parte desses mitos acreditar que os abusos sexuais de crianças raramente acontecem; que abusos sexuais acontecem somente em “famílias desestruturadas” ou que convivem com “coisas erradas”; que apenas crianças pobres ou sem família sofrem violações sexuais, etc.
Apesar das pesquisas e da literatura da área mostrarem que essas crenças não correspondem à realidade, muitas dessas ideias continuam existindo. É importante saber que abusos sexuais são comuns e frequentes (as estatísticas variam segundo a fonte), contudo, se trata de um tema tabu que é pouco falado, pouco denunciado e que pode permanecer guardado com a vítima por muito tempo. Além disso, as violações sexuais não acontecem apenas em alguns tipos de comunidades, culturas ou classes sociais. Também não acontecem apenas em “famílias desestruturadas”. Na verdade, os abusadores sexuais são espertos e podem estar em qualquer espaço social, muitas vezes se tornam amigos dos pais e das crianças, circulam em ambientes respeitáveis e podem ter comportamentos acima de qualquer suspeita.
Enquanto ficamos presos na ideia de que as crianças próximas a nós estão fora de perigo e que abuso sexual é coisa rara porque quase não é falada, acabamos por ignorar os riscos e as vulnerabilidades existentes na nossa própria comunidade e família. Desfazer desse tipo de crença é importante para se obter informações em fontes seguras e que, de fato, ajudem a proteger as crianças. Para isso, é necessário enfrentar o desconforto causado pelo assunto e buscar informações sérias, que não reforcem o sensacionalismo e o medo.
Silvia Pereira Guimarães
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