Garantir que uma vítima de abuso sexual permaneça em silêncio sobre a violência interessa enormemente ao agressor. Em primeiro lugar, a situação é vantajosa para ele porque a criança continua submetida a seus atos, oportunizando repetições dos episódios abusivos. Além do mais, quando a vítima não revela o problema vivenciado, é menor o risco de que o abusador seja exposto socialmente, denunciado e preso.

Por si só, os casos de violência sexual são difíceis de serem trazidos à tona pelas crianças e adolescentes. Tratam-se de ocorrências que provocam grande desorganização psicológica e que mobilizam sentimentos de medo, ansiedade, vergonha e culpa. Frente ao trauma, normalmente as pessoas evitam pensar sobre o evento adverso e, para as vítimas, é bastante complicado administrar o impacto emocional, encarar a necessidade de rememorar as cenas de violência e falar sobre elas para terceiros. Isso tudo costuma ser suficiente para que crianças e adolescentes submetidos a abusos demorem, ou até mesmo, nunca revelem sobre essa experiência. 

Não bastasse essa limitação para as vítimas contarem o problema, os agressores sexuais costumam usar de estratégias diversas para minimizar as possibilidades de que os abusos sejam explicitados. Uma de suas táticas mais frequentes para isso envolve a realização de ameaças à integridade física da criança/adolescente ou de pessoas que ela ama. Nesses casos, as vítimas são intimidadas por meio de frases como: “Se você contar para alguém, vou te dar uma surra”, “eu te mato” ou “eu mato a sua mãe”.

A chantagem emocional é outra maneira que alguns abusadores adotam para forçar a vítima a esconder sobre a violência. Nesses casos, a manipulação costuma funcionar quando há vínculo afetivo entre ele e a criança, ou ainda, quando a família depende financeiramente dele. Assim, o agressor alerta a vítima de que ele pode ser preso pelos abusos, sendo que será culpa dela se ele for afastado da convivência em casa ou se a mãe e os irmãos não tiverem recursos para se manterem.

Outra alternativa explorada pelos agressores para manter as crianças caladas sobre os abusos sofridos envolve a sedução de suas vítimas através de benefícios materiais. Aqui, eles negociam pelo segredo sobre a violência oferecendo presentes, dinheiro, doces ou outros tipos de itens que sejam atrativos aos pequenos. Podem, deste modo, usar barganhas como: “Não fala disso com ninguém e te dou um telefone celular”.

Além das inúmeras táticas já mencionadas, para garantir que a criança não revele um abuso, o agressor muitas vezes procura convencer a vítima de que, por ser adulto, ele tende a ter mais credibilidade que alguém mais novo. Tendo em vista que nossa cultura é adultocêntrica e que as crianças são ensinadas a sempre obedecerem aos mais velhos, é usual que as vítimas se sintam receosas em se posicionarem contra um adulto. Os abusadores se aproveitam desse temor e lhes dizem coisas, tais como: “Se você falar algo sobre isso, vão dizer que você é mentirosa” ou “Ninguém vai acreditar em você”.

É devido às circunstâncias aqui discutidas que estimulamos os pais a criarem um ambiente de diálogo permanente em casa. A confiança em seus genitores, o acolhimento recebido cotidianamente por parte deles e a compreensão de que eles são preparados para protegê-las, facilita com que as crianças exponham sobre suas experiências ruins, ainda que estejam sob pressão. Construído aos poucos, é esse tipo de suporte emocional que ajuda que situações abusivas sejam reveladas muito precocemente, eliminando o contexto de segredo e silêncio tão interessante aos agressores. 

Liliane Domingos Martins