Nem todo pedófilo é abusador e nem todo abusador é pedófilo. Sempre que essa frase é dita e que se busca explicar, à luz da Psicologia, sobre as diferenças entre as figuras do abusador sexual em relação à do pedófilo, comentários reativos e emocionados, por vezes ofensivos e raivosos, se fazem presentes. Por sua vez, basta uma análise menos apaixonada e uma leitura cuidadosa do conteúdo para se compreender as razões dessa distinção.
Para esclarecimento, o pedófilo é um adulto que tem desejo sexual por crianças, ou seja, aquele que se sente estimulado e excitado por meninos e meninas. É evidente que esse tipo de preferência sexual não é socialmente aceita, porém, boa parte das pessoas com transtorno pedofílico têm consciência disso, procura controlar seus impulsos e não chega a se envolver sexualmente com crianças. Nesses casos, portanto, os pedófilos não se tornam abusadores.
Isso entendido, podemos pensar sobre quem são os abusadores. Os abusadores são aqueles que efetivamente se envolvem sexualmente com crianças, seja por meio da incitação sexual delas, de toques indevidos, de penetração ou qualquer outra forma de contato erotizado e precoce à idade. Alguns abusadores são pedófilos, à medida que são sexualmente atraídos por crianças e não refreiam suas vontades: seduzem e aliciam infantes para viverem com eles as suas preferências íntimas. Outra parte dos abusadores não têm necessariamente qualquer interesse sexual por crianças, mas abusam por outras razões: porque encontraram uma vítima desprotegida, sem atenção de outros adultos; porque se sentem poderosos em subjugar alguém mais fraco; por vingança de algum parente daquela criança ou pela desobediência dela; etc.
Os equívocos em relação aos dois termos surgem especialmente em função do que é difundido pela mídia. No geral, as reportagens sobre violência sexual de crianças e adolescentes colocam o pedófilo e o abusador como uma coisa só. Não bastasse a unificação desses conceitos em desconsideração à ciência da área, a mídia também tem ganhos em incitar o ânimo das pessoas através da criação de vilões e de espetáculos que atraem audiência, o que implica em comentários inflamados sobre esse assunto.
Em meio a toda essa emocionalidade tão marcante é preciso que a racionalidade também ganhe espaço. A emoção é de grande utilidade para mover as pessoas a cobrarem pelos direitos de crianças e adolescentes, para se exigir que os crimes cometidos contra elas tenham a devida responsabilização. Por sua vez, a consideração racional acerca da distinção entre o pedófilo e o abusador permite compreender que não há nisso um propósito de defesa sobre qualquer um desses atores e que o pressuposto de tal categorização é unicamente didático.
A devida distinção entre o pedófilo e o abusador existe porque as pessoas não podem ser criminalizadas tão somente por seus desejos, pelo que se passa na mente delas. Em verdade, somente os atos podem ser criminalizados, o que significa que apenas aqueles que realmente agrediram sexualmente uma criança, ou seja, os abusadores, serão devidamente responsabilizados por seus atos.
Esses esclarecimentos representam um compromisso do Instituto Alexis, que procura desmistificar confusões que as pessoas costumam ter sobre a violência sexual de crianças e adolescentes, já que essas muitas vezes destoam dos resultados dos estudos e pesquisas na área.
Liliane Domingos Martins