Privacidade e segredo são duas coisas bem diferentes. Ambos fazem parte da vida das pessoas, mas é importante entender a distinção entre eles quando se busca cuidar de crianças e adolescentes contra abusos sexuais.
A privacidade refere-se a certas experiências que os filhos têm sozinhos, mas que os pais sabem a respeito. Por exemplo, a maior parte das pessoas prefere ter privacidade ao usar o banheiro, seja para tomar banho ou usar o sanitário. Essas são situações em que nossas partes íntimas estão expostas e, como sabemos, o ideal é que terceiros não toquem ou vejam essas áreas do corpo dos outros. Sendo assim, as crianças são estimuladas desde novas a serem independentes quanto aos hábitos de higiene, de forma a dispensarem ajuda e a garantirem a própria privacidade nesses momentos.
No desenvolvimento da sexualidade, a exploração dos próprios genitais pela criança, no sentido da curiosidade e da geração de sensações, é outro hábito natural, com os quais os pais não precisam se chocar. Caso não identifiquem anormalidades nessa prática, devem dar espaço para esclarecer as dúvidas dos filhos sobre o assunto e, principalmente, orientá-los de que tal comportamento deve ser sempre privado. Isso significa que os toques da criança em seus órgãos genitais devem ser realizados em locais isolados e sem contato com outras pessoas. Elas não podem, assim, fazer isso na escola, na frente de colegas ou de qualquer um mais velho.
Dessa maneira, a privacidade é assumida como algo bom, que permite ao indivíduo se conhecer melhor, a aprender sobre seus limites e sobre a importância de que respeitem seu espaço pessoal e momentos mais particulares, tudo isso feito de forma segura. De modo oposto, o segredo não costuma ser algo positivo, já que ele surge de situações em que as crianças e adolescentes estão amedrontados ou constrangidos demais para contar aos pais sobre o que se passou.
Crianças que temem seus genitores, que têm receio de apanhar ou de sofrerem castigos severos procuram guardar segredos de seus pais como meio de evitar tais punições. Do mesmo jeito, aquelas que não têm um diálogo próximo e fácil com os seus responsáveis podem se sentir desconfortáveis para esclarecer sobre situações que envolvam as próprias descobertas sexuais, as dúvidas quanto ao tema, ou mesmo, para comunicar sobre qualquer aproximação abusiva.
Nesses casos, o segredo representa uma ameaça à segurança das crianças ou adolescentes, pois eles ainda não têm capacidade suficiente para, sem ajuda, dimensionar os riscos de algumas circunstâncias a que são expostos. Os pais, por sua vez, quando desconhecem as situações vividas por seus filhos, não têm como avaliar os problemas que lhes acometem, de onde vêm ou o quanto são perigosos. Em consequência, também não conseguem tomar as providências necessárias para manter suas crianças mais protegidas quanto a essas experiências ruins. Tal quadro faz com que os infantes tornem-se alvos fáceis de pessoas mal intencionadas e que, inclusive, estimulam a manutenção de segredos em relação aos pais. Isso é algo frequente em episódios de violência sexual.
Participe ativamente da vida dos seus filhos, demonstre interesse pelo que fazem, converse com eles sobre atividades cotidianas e permitam também que tenham momentos a sós. Esse tipo de atitude fortalece a identidade e individualidade das crianças e adolescentes, e melhor ainda, fortalece os laços entre pais e filhos. Quando essa relação de proximidade, diálogo e confiança é construída, há menos espaço para segredos e é possível que todos permaneçam mais resguardados contra qualquer forma de violência.
Liliane Domingos Martins
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