O abuso sexual de crianças e adolescentes nem sempre envolve o emprego de condutas agressivas. Em realidade, na maior parte dos casos, o ofensor aborda a vítima como se estivesse fazendo uma brincadeira, um carinho, auxiliando com algum cuidado de higiene ou como se o ato fosse um mero acidente.
O abuso disfarçado de brincadeira pode se dar, por exemplo, quando o agressor faz cócegas na criança, mas aproveita para tocar nas partes íntimas dela; ou quando desfruta do prazer da fricção genital que a vítima faz quando brinca de “cavalinho” em seu colo. Também há aqueles casos em que “o tio” coloca balas ou brinquedos dentro da roupa da vítima e, ao procurar o objeto, passa a mão pelo corpo dela.
Em outras situações, o abuso é empreendido pelo agressor como se fosse uma demonstração de afeto. Somos acostumados a expressar carinho por meio de toques como o beijo e o abraço, que são bastante agradáveis. Especialmente no caso de crianças mais novas, porém, pode ser difícil diferenciar esse tipo de carícia de, por exemplo, um beijo dado maliciosamente em seu órgão genital. Para elas, nenhuma parte do corpo é sexualizada e, tudo o que percebem, costuma ser a sensação gostosa que aquele contato lhe provoca.
Há ainda os casos de violência sexual em que o abusador finge estar prestando um cuidado de higiene à vítima enquanto, na verdade, explora o corpo dela. São comuns as queixas sobre pais abusivos que tocam o corpo de seus filhos de maneira exagerada durante o banho e que se justificam na necessidade de limpeza para manipular a vagina e o ânus de suas crianças.
No mais, o ato abusivo pode também ser realizado de modo a parecer um acidente ou acaso, um contato físico indevido que o agressor diz ter ocorrido “sem querer”. Isso se reflete, por exemplo, em ocasiões nas quais o adulto passa em um lugar apertado procurando esfregar seu corpo contra o da criança ou finge cair e buscar equilíbrio na vítima, aproveitando-se para tocar em seus seios.
Todas essas circunstâncias são implementadas pelo agressor de um jeito que suas más intenções não fiquem evidentes e pareçam aproximações inocentes. Da forma como fazem, fica mais complicado para as crianças e adolescentes entenderem que aquele contato é inapropriado, o que torna improvável qualquer reação ou relato por parte delas. Mesmo para outros adultos, pode haver alguma confusão para compreender que aquele conhecido que brinca e auxilia com os pequenos da casa não oferece ajuda genuína, mas procura tão somente oportunidades de abuso.
Para todos aqueles que estão dedicados a saber mais sobre como ocorre a violência sexual contra crianças e adolescentes é preciso ter em mente que o processo abusivo pode ser sutil como descrevemos. Estando consciente sobre esse risco, você fica mais preparado para distinguir quando a aproximação de outros adultos é amigável em comparação a outras interações que envolvem manipulação e podem ser prejudiciais aos seus filhos.
Liliane Domingos Martins